Nem todo mundo associa, hoje, as palavras que nomeiam esta coluna. Para muitos, usabilidade é algo que não lembra acessibilidade - mas não é bem assim. Afinal, ambas estão no âmbito do que costumamos chamar "acesso universal" - a possibilidade de estabelecer comunicação e troca de conhecimentos "independentemente de hardware, software, infra-estrutura de rede, idioma nativo, cultura, localização geográfica, habilidade física ou mental", como bem afirma Claudia Dias em seu livro "Usabilidade na Web - criando portais mais acessíveis".
Ainda assim, procuraremos, para fins didáticos, trabalhar de forma individual cada um desses dois termos, para então começarmos a usá-los em conjunto. Para tanto, é importante compreendermos claramente o que é acessibilidade e usabilidade de forma geral.
Para uma introdução aos temas, vejam a definição de Usabilidade (neologismo traduzido do inglês "Usability" e amplamente aceito) do livro da Cláudia Dias - onde ela faz referência a ISO 9241, parte 11:]
"capacidade de um produto ser usado por usuários específicos para atingir objetivos específicos com eficácia, eficiência e satisfação em um contexto específico de uso (ISO, 1998). Alguns autores preferem adotar a expressão 'qualidade de uso' ".
Abordaremos esse tema com mais profundidade nos próximos artigos.
ACESSIBILIDADE: LATO OU STRICTO SENSU?
Já o termo acessibilidade, visto de uma forma estrita, está associado à situação de uma pessoa ter ou não acesso fácil a uma determinada informação de um website ou produto de tecnologia. De forma mais ampla, acessibilidade pode estar ligada a várias áreas de atividades.
Neste sentido mais amplo, duas definições se destacam:
"Facilidade de acesso, de obtenção. Facilidade no trato." - definição do dicionário Michaelis
"Possibilidade de acesso (ONU), processo de conseguir a igualdade de oportunidades em todas as esferas da sociedade." - ONU / Direitos Humanos
Nelas, fica claro o quão vasto pode ser o terreno da acessibilidade, dependendo do enfoque escolhido.
Outro enfoque, comumente utilizado (e que será um dos temas da nossa coluna), relaciona acessibilidade às pessoas com deficiência, já que as barreiras que elas encontram são tão amplas quanto as suas limitações individuais. Dentre as principais limitações, podemos citar: arquitetônicas, nos transportes, à comunicação, acesso à educação, ao meio físico, a equipamentos e programas adequados, acesso de informação em formatos alternativos e barreiras para entrar no mercado de trabalho.
Outra definição específica e recente é a que consta no corpo do Decreto Nº- 5.296, de 2 de Dezembro de 2004, da Presidência da República:
"acessibilidade: condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;" (Decreto Nº- 5.296, de 2 de dezembro de 2004 - Presidência da República )
UM EM CADA SETE BRASILEIROS TEM ALGUMA DEFICIÊNCIA
Avaliar a importância dessa temática na área da informática, associada à concepção de ambientes corporativos, tem se tornado um forte foco de atenção de gestores públicos e privados, equipes de testes de sistemas e usabilidade. Afinal, o universo total de pessoas com deficiências no Brasil somam mais de 25 milhões (dados do Censo IBGE 2000 - pessoas com pelo menos um tipo de deficiências). Assim, se você pensava que acessibilidade em portais corporativos era algo restrito, que só interessa a uma meia dúzia de pessoas, está na hora de mudar os seus conceitos...
Aliás, vale ressaltar que o termo correto (ou mais adequado) para tratamento, segundo elas próprias, é "pessoa com deficiência" e não "portador de deficiência". A idéia de que ela "porta" alguma coisa não é coerente com sua realidade, uma vez que a deficiência é uma característica. Para exemplificar, quando tratamos uma pessoa com olhos azuis, não nos referimos a ela como portadora de olhos azuis, mas pessoa com olhos azuis.
ACESSIBILIDADE DIGITAL: NOSSA PRAIA
Assim, chegamos a um termo composto, que muito nos interessa: acessibilidade digital. Ela refere-se à flexibilidade no acesso à informação e na interação dos usuários que possuam algum tipo de deficiência quando os mesmos vão interagir com mecanismos de navegação e apresentação das páginas/telas, operação de softwares, hardwares e adaptação de ambientes e situações.
O W3C (Consórcio para a WEB) e WAI (Iniciativa para a Acessibilidade na Rede) apontam situações e características diversas a que o usuário pode estar sujeito e que podem impactar sua interação no meio digital:
1. Incapacidade de ver, ouvir ou deslocar-se, ou grande dificuldade - quando não a impossibilidade - de interpretar certos tipos de informação.
2. Dificuldade visual para ler ou compreender textos.
3. Incapacidade para usar o teclado ou o mouse, ou não dispor deles.
4. Insuficiência de quadros, apresentando apenas texto ou dimensões reduzidas, ou uma ligação muito lenta à Internet.
5. Dificuldade para falar ou compreender, fluentemente, a língua em que o documento foi escrito.
6. Ocupação dos olhos, ouvidos ou mãos, por exemplo, ao volante a caminho do emprego, ou no trabalho em ambiente barulhento.
7. Desatualização, pelo uso de navegador com versão muito antiga, ou navegador completamente diferente dos habituais, ou por voz ou sistema operacional menos difundido.
Essas diferentes situações e características precisam ser levadas em conta também pelos gestores de Intranets e portais corporativos. Novas situações e observações do W3C estão sendo estudadas na atual versão, que está em fase de rascunho.
Assim, para serem realmente potencializadores da acessibilidade, os projetos dos ambientes para interação devem proporcionar respostas simultâneas a vários grupos de incapacidade ou deficiência e, por extensão, ao universo de usuários da web (afinal, um portal corporativo pode também ter como público, por exemplo, fornecedores, parceiros e clientes finais).
Falar de acessibilidade no ambiente corporativo é, portanto, falar numa célula fundamental para o desenvolvimento profissional de qualquer pessoa, inclusive aquelas com deficiências. Pense nisso...
Fonte: Aracy Gonçalves é Analista de Sistemas, designer multimídia e professora. Atuou em empresas como SBT online, Telemig, Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG e PRODAM/SP. Mestre em Artes Visuais e Tecnologia da Imagem, é consultora em usabilidade e acessibilidade digital, com experiência no desenvolvimento de interfaces acessíveis (sistemas e serviços públicos via web). Pesquisadora de requisitos técnicos e soluções de tecnologia para acessibilidade. Colaboradora da elaboração da norma técnica para Acessibilidade na web - ABNT.
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